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“O momento constituinte foi muito marcante para a Instituição e para a minha vida”, orgulha-se José Antonio Paganella Boschi

Representante da classe durante o mandato 1986-1988, ex-presidente da AMP/RS relembra a mobilização nacional que consolidou o Ministério Público na Constituição Federal de 1988
05/03/2021 Atualizada em 21/07/2023 10:57:19
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A Constituição Federal de 1988 é a lei fundamental e suprema do Brasil. Ela serve de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, situando-se no topo do ordenamento jurídico. Devido à importância desta matéria e de todo o impacto que sua promulgação geraria, diversos segmentos da sociedade se organizavam com vistas à Assembleia Constituinte de 1987 com a perspectiva de recompor um novo projeto nacional. Neste mesmo movimento, desde 1986, quando assumiu a presidência da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul (AMP/RS), José Antonio Paganella Boschi, direcionou seus esforços para representar a entidade durante o processo em Brasília.



O Ministério Público vinha de inúmeras batalhas travadas no campo legislativo e encarou o desafio da mobilização com seriedade, pois via a chance de consolidação institucional. Urgia que se desenhasse uma consciência comum, capaz de propor uma feição única para a Instituição em todo o País. Neste cenário, procuradores e promotores de Justiça pretendiam se antecipar aos esforços legislativos, evitando serem desconsiderados durante o processo democrático.



Desde a Emenda Constitucional nº 7 de 1977 já se tinha assegurado que a Lei estabelecesse normas gerais para o Ministério Público Nacional, e este já tinha sido o ponto de partida para um estatuto básico comum para a Instituição que, até então, era muito díspar. Enquanto os Ministérios Públicos de São Paulo, do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais já estavam mais desenvolvidos institucionalmente, o Ministério Público da União e os dos outros estados ainda não tinham sequer os mesmos órgãos de administração superior.



Neste contexto, a Confederação das Associações Estaduais do Ministério Público (CAEMP) – atual CONAMP – ganhou destaque a partir da percepção de que não seria possível revolucionar o Ministério Público pela mobilização isolada dos estados, pois a Instituição assumia formatos muito variados.



Entretanto, era evidente que a atuação desta entidade classista de alcance nacional apenas poderia ser eficaz se a direção dos trabalhos fosse acompanhada pela integração de representantes de associações estaduais fortemente mobilizadas. Assim, a participação do Rio Grande do Sul na CAEMP foi significativa desde o início.



Como presidente da AMP/RS, José Antonio Paganella Boschi relembra com orgulho o sentimento geral da classe com relação ao objetivo de configurar constitucionalmente o Ministério Público. “Na condição de presidente da Associação, tive o privilégio de representar a classe nos movimentos destinados à construção formal de uma Instituição que até então não existia. Os promotores de Justiça diziam que existia o Ministério Público, mas que do ponto de vista constitucional ele não estava ainda bem desenhado”, relembra.



A busca do discurso comum



Para uniformizar o discurso da Instituição em nível nacional, foram realizados diversos debates. Em 1985, a discussão foi o foco do VI Congresso Nacional do Ministério Público, realizado em São Paulo. No ano seguinte, dando continuidade aos debates promovidos em São Paulo, realizou-se em Curitiba o I Encontro Nacional de Procuradores-Gerais de Justiça e Presidentes de Associações de Ministério Público, onde nasceu a Carta de Curitiba, que aproximou todas as lideranças em torno de uma proposta única de texto constitucional para a Instituição. Ao final do evento, uma moção redigida pela delegação paulista, com apoio decisivo da delegação gaúcha, foi aprovada por unanimidade, comprometendo-se a evitar negociações isoladas durante a Constituinte.



No Rio Grande do Sul, a classe estava coesa em torno de um mesmo projeto. Deste modo, a AMP/RS, sob a liderança associativa de José Antonio Paganella Boschi, organizou, em dezembro de 1986, uma Comissão Pró-Constituinte. Logo em seguida, em fevereiro de 1987, Paulo Olímpio Gomes de Souza e Paganella Boschi tomaram a frente na organização da Comissão Nacional Pró-Constituinte, que se mobilizou sob o abrigo da CONAMP.



Em abril daquele ano, os olhos permaneceram voltados para a Constituinte durante o VII Congresso Nacional do Ministério Público, realizado em Belo Horizonte (MG). Na ocasião, foram debatidos os projetos existentes para a conformação da Instituição. No encontro, a CONAMP conduziu uma assembleia geral que tomou importantes deliberações. Assim, a entidade nacional intensificou a vigília, preparando a atuação junto aos membros da Comissão Temática, responsável pelos trabalhos da Constituinte.



Durante o resto de 1987, as Comissões Temáticas da CONAMP trabalharam fortemente na construção de emendas, mas foi no final do mês de junho, em uma outra assembleia geral da CONAMP que se deliberou pela criação de uma Comissão Nacional de Alto Nível, integrada por agentes dos cinco principais estados da Federação, para acompanhar de perto o andamento dos projetos caros ao Ministério Público na Constituinte.



A liderança coube, sobretudo, aos representantes das Associações de São Paulo e do Rio Grande do Sul, os quais, juntamente com o pessoal de Minas Gerais e com Elza Lugon, presidente da Associação do Distrito Federal, formavam o núcleo permanente da vigília da CONAMP no Congresso.



Negociações no Congresso: delegação gaúcha como peça fundamental



No Congresso, a bancada gaúcha do Ministério Público se articulou alinhada com as bancadas de São Paulo e do Paraná. A Comissão Nacional Pró-Constituinte e a CONAMP contaram com especial receptividade junto aos deputados gaúchos Ibsen Valls Pinheiro (PMDB), Nelson Azevedo Jobim (PMDB), Ivo Orlindo Mainardi (PMDB) e Victor José Faccioni (PDS). Mas foi no gabinete de Ibsen Pinheiro que, desde o início do processo constituinte, a CONAMP praticamente se instalou.



Auxiliadas por Ibsen Pinheiro, as lideranças do Ministério Público fizeram um mapeamento cuidadoso de todos os constituintes e dos promotores que teriam algum tipo de acesso aos mesmos, procurando imprimir um trabalho de convencimento das propostas institucionais de fora para dentro. Papel importante na coordenação destes trabalhos foi desempenhado pelo então promotor de Justiça Eduardo Lucho Ferrão, que era assessor parlamentar do deputado Jobim e que hoje exerce a advocacia em Brasília.



O principal trunfo do Ministério Público na Constituinte foi a posse de uma proposta homogênea e objetiva, produto de um longo processo de amadurecimento interno do conjunto da classe, e que, além disso, transitava com independência face às questões propriamente ideológicas, que tencionavam a Constituinte, tais como a reforma agrária, entre outros temas.



O Ministério Público estava tão organizado que eram feitos plantões no Plenário, vigílias na gráfica do Senado, peregrinações nos gabinetes parlamentares, consultas relâmpagos a toda a classe. Segundo o ex-presidente Paganella Boschi, apesar de aquele período ter sido muito analógico, a mobilização para tomada de decisão da classe era bastante ágil.



“Nosso lema aos constituintes foi sempre ‘queremos construir uma Instituição independente para promover a defesa do interesse público’. Em momento algum houve reivindicações de cunho classista e isso ajudou muito na percepção da seriedade do discurso dos promotores”, recorda.



“Foi algo extremamente democrático, todas as decisões tomadas em Brasília foram precedidas de contatos com promotores da base e muito instantâneas, pois uma demanda era passada para todo o País e em cerca de poucas horas já tínhamos o retorno com a posição de cada Estado. O grupo que negociava em Brasília nunca esteve completamente desvinculado da base. A liberdade que tinham era controlada, era vigiada, tudo que se propunha fazer tinha respaldo na base”, recorda.



Após diversas articulações políticas conjuntas, em 3 de setembro, o texto substitutivo de Bernardo Cabral foi recebido com júbilo pelos membros do Ministério Público em todo o País. A Instituição foi contemplada com garantias e funções relevantes inclusive no âmbito pré-processual. Já a regra que instituía a paridade salarial com a Magistratura foi substituída por um sistema de simetria entre o Ministério Público e o Judiciário, assegurando as mesmas garantias e vedações constitucionais.



Enquanto se davam os grandes embates no plano legislativo, regionalmente a Associação também enfrentava novos obstáculos. No início do segundo semestre de 1987, a diretoria precisou repensar o orçamento administrativo da entidade ao perder a receita oriunda das custas judiciais. A nova conjuntura exigiu reorganização financeira, mas a Associação se encontrava em excelente condição graças às gestões anteriores. Graças a isso e sem embargo da perda da receita das custas, no início de 1988, foi adquirida uma sede própria, alocada no terceiro andar do Edifício Amazônia, na avenida Borges de Medeiros, 652, no Centro de Porto Alegre.



No Congresso Nacional, após o recesso de fim de ano, as atividades foram retomadas com ânimo. Em agosto, foi publicado o texto elaborado pelos constituintes no primeiro turno das votações e submetido mais uma vez à relatoria de Bernardo Cabral. O texto referente ao Ministério Público sofreu ajustes mínimos de redação. Onze emendas e destaques tramitavam no segundo turno dizendo respeito à Instituição. Mais uma vez, retornava a ameaça de confisco da privatividade da ação penal e de cassação do princípio de controle externo da polícia.



Nesta etapa, a intenção era evitar retrocessos e garantir uma redação mais enxuta e precisa em certos artigos, alguns dos quais aprovados em virtude de negociações políticas com outros setores para viabilizar a estrutura principal do projeto. Porém, o pior havia passado e, finalmente, no dia 5 de outubro de 1988, era promulgada a "Constituição Cidadã”.



De modo geral, a Constituição avançou em face da Carta de Curitiba. Pela primeira vez, um texto constitucional disciplinou de forma orgânica e harmônica a organização e as atribuições do Ministério Público no País. O Ministério Público foi cometido pelo zelo das principais formas do interesse público. Foi incumbido da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. As garantias institucionais de unidade, indivisibilidade e autonomia firmaram-se na base da independência funcional dos membros.



Na área criminal, a Constituição explicitou que competia à Instituição, privativamente, a promoção da ação penal pública. Conferiu-lhe ainda o exercício do controle externo da atividade policial, em nível federal e estadual. Permitiu-lhe requisitar diligências investigatórias e determinar a instauração de inquérito policial. Na área cível, além da promoção da ação de inconstitucionalidade, passou-se a reconhecer ao Ministério Público a função de defesa dos interesses indígenas em juízo e a promoção da ação civil pública. Além disso, a Constituição deferiu explicitamente ao Ministério Público a vigilância da probidade administrativa dos governantes.



“Nesse processo, constituiu-se o que seria o Ministério Público de hoje. Foi um momento muito importante, histórico, que também possibilitou materializar os anseios de uma classe inteira e de muitos colegas que haviam se empenhado de corpo e alma ao longo da carreira para que isso acontecesse", orgulha-se o ex-presidente José Antonio Paganella Boschi.



“O momento constituinte foi muito marcante para a Instituição e para a minha vida”, emociona-se ao rememorar e registrar a atuação de promotores e procuradores gaúchos - cujos nomes citou, mas preferiu que não fossem mencionados a fim de não cometer injustiça se deixasse involuntariamente alguém de fora.



Em 1994, após mais de vinte anos de trabalho dedicado ao Ministério Público, de quase quinze anos como desembargador nomeado na vaga do Quinto Constitucional, e mais de 30 anos, no magistério superior da PUCRS, Bochi passou a se dedicar, exclusivamente, à advocacia.



"Minha vida foi de trabalho e quero trabalhar até o fim", disse com um sorriso nos lábios. Em seu escritório, há na parede um quadro contendo o original de uma carta assinada pelo constituinte José Inácio Ferreira, vice-presidente do Senado Federal, com os cumprimentos pela contributiva participação no processo constituinte de 1988. Uma prova de que representou fortemente os procuradores e promotores de Justiça do Rio Grande do Sul em um dos momentos mais importantes para a Instituição.



Produzida pelo setor de Comunicação, a série "Presidente da Semana" resgata a memória da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul (AMP/RS) por meio do depoimento dos promotores e procuradores de Justiça que ocuparam a Presidência da entidade ao longo de seus quase 80 anos de história. A série é publicada desde fevereiro de 2021, sempre às sextas-feiras, no site da Associação.
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